Se há alguma coisa que consegue preencher algum sentido no assassinato de nossos familiares, é que criaremos tamanha união que impeça que tal destino ocorra novamente.
Hoje, em 27 de Janeiro de 2017, o mundo comemora o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto. Hoje o mundo de novo cada vez mais está antissemita. Hoje, podemos impedir que um Segundo Holocausto aconteça, pois vai acontecer, a menos que tomemos acção assertiva.
Pouco tempo antes da expulsão de Espanha, os Judeus ansiosamente se assimilaram entre seus anfitriões espanhóis, escreveu a aclamada historiadora Jane S. Gerber em Os Judeus de Espanha: Uma História da Experiência Sefardita. A judiaria espanhola considerava Espanha a nova Jerusalém e pensava que “a presença de tantos Judeus e Cristãos de ascendência judia nos círculos internos da corte, das municipalidades e até da igreja católica podiam fornecer protecção e evitar o decreto” de expulsão. Eles estavam errados.
Tal como seus irmãos na Espanha, os Judeus alemães acreditavam que se eles fossem assimilados entre os alemães, estariam seguros do eterno dedo acusador que é a sorte do Jude. Os professores Steven J. Zipperstein de Stanford University e Jonathan Frankel da Universidade Hebraica de Jerusalém, escrevem em Assimilação e Comunidade: Os Judeus na Europa do Século Dezanove, que alguns anos após o começo da emancipação judia, David Friedlander, um dos líderes mais notáveis da comunidade, sugeriu que os Judeus de Berlim se converteriam ao cristianismo em massa. Lembramos hoje como esta assimilação terminou.
Durante muitos séculos, quando quer que os Judeus tentassem abandonar a tribo, sua nação anfitriã os puniria fortemente. Durante séculos, aqueles que adoram e odeiam Judeus em semelhança ficaram atónitos com a sobrevivência dos Judeus apesar da sua constante perseguição e extermínio. O escritor Mark Twain ponderou sobre a sobrevivência judaica no seu ensaio, “Sobre os Judeus“: “O Egípcio, o Babilónio e o Persa se levantaram, preencheram o planeta com som e esplendor, então esvaeceram para a matéria dos sonhos e faleceram; o Grego e o Romano se seguiram e fizeram um grande ruído e desapareceram. O Judeu os viu a todos, os venceu a todos e é agora aquilo que sempre foi. Todas as coisas são mortais menos o Judeu; todas as outras forças passam, mas ele permanece. Qual o segredo da sua imortalidade?”
Por muito estranho que pareça, até Adolf Hitler questionou como é que os Judeus sobreviveram até então. Em Mein Kampf escreveu ele, “Quando durante longos períodos da história humana escrutinei a actividade do povo Judeu, subitamente surgiu em mim a questão temerosa se o destino impenetrável, talvez por razões desconhecidas a nós pobres mortais, não haveria desejado, com resolução eterna e imutável, a vitória final desta pequena nação.”
As nações não conseguem solucionar o enigma da nossa sobrevivência, somente nós conseguimos fazer isso.
Por Que Somos Afligidos e Por Que Sobrevivemos
Nós Judeus não somos como qualquer outra nação. Podemos querer ser, mas o facto de o mundo inteiro nos criticar todos os dias, que o Conselho de Segurança da ONU debater quase exclusivamente Israel e que os Judeus são o alvo principal de crimes de ódio não só na Europa, mas até nos EUA, comprova que somos de longe a nação mais odiada do planeta.
A inauguração de Donald Trump enquanto Presidente pode dar-nos um intervalo do ódio pelos Judeus, mas se não respondermos correctamente à oportunidade, a repercussão explodirá nas nossas faces, muito literalmente. Até se o Presidente Trump vetar todas as resoluções da ONU anti-Israel, isto não vai abater o ódio que as nações sentem para nós. Mais cedo ou mais tarde, também ele, terá de reconsiderar a sua posição. Então, para evitar outro holocausto. Devemos entender nossa posição única no mundo e agir respectivamente.
“Os Judeus São Responsáveis por Todas as Guerras no Mundo”
A infame frase de Mel Gibson, “Os Judeus São Responsáveis por Todas as Guerras no Mundo,” tal como a declaração do General William Boykin, “Os Judeus são o problema, os Judeus são a causa de todos os problemas no mundo,” reflectem um pressentimento a certa medida que o mundo compartilha. Pior ainda, quanto mais insolúveis os conflitos do mundo se tornam, mais o mundo culpa os Judeus. Conscientemente ou não, a humanidade se lembra que imediatamente após nos termos comprometido a nos unirmos “como um homem com um coração,” deste modo nos tornámos uma nação que foi encarregada de ser “uma luz para as nações.” Até se as pessoas não conseguirem exprimi-lo, elas conseguem sentir que a luz que devemos trazer para o mundo é a luz da união e da paz, essa união única que havíamos alcançado no pé do Monte Sinai. Portanto, enquanto houverem ódio e guerra no mundo, haverá antissemitismo.
Mas para trazer a paz, devemos entender o seu sentido. Quando nossos sábios falaram da paz, eles não se referiam à ausência da guerra. Para evitar a guerra, simplesmente podemos evitar o contacto. A palavra shalom (paz) vem da palavra hebraica shlemut (inteireza). Fazer a paz significa fazer algo inteiro. Significa pegar em dois opostos em conflito e os unir de tal maneira que sejam um novo inteiro. Essa é uma entidade que não é nenhum deles, todavia que é descendente de ambos e que ambos acarinham. Tal como um homem e mulher juntos criam uma criança que não é da mãe nem do pai, mas que é a criação amada de ambos, a paz é a inteireza resultante que duas visões opostas em conflito criam.
Está escrito no livro Likutey Halachot (Regras Sortidas), “A essência da vitalidade, existência e correcção na criação é alcançada por pessoas de opiniões divergentes se misturarem juntas em amor, união e paz.” Abraão ensinara esta união especial aos seus discípulos e descendentes e Moisés ensinou isto à nação inteira até que se unissem nos seus corações e assim se tornassem uma nação com uma missão de completar a obra de Moisés e transmitir esta sabedoria ao resto do mundo. O Ramchal escreveu no seu livro, O Comentário do Ramchal sobre a Torá: “Moisés desejou completar a correcção do mundo nesse tempo, mas ele não teve sucesso devido às corrupções que ocorreram no caminho.” Ainda sofremos da corrupção, ela é o ódio infundado que nos separa e nos apresenta como “trevas para as nações” em vez de sua luz.
Para entender de que modo nos devemos unir em prol de nos tornarmos essa luz, pense nos nossos corpos. A diversidade de funcionalidades dos órgãos no nosso corpo assegura nossa saúde. O fígado, coração e rins funcionam de modo muito diferente e todos requerem sangue. Se não soubéssemos que estes órgãos se complementam uns aos outros para manter nossa saúde, podíamos pensar que eles competem pela mesma fonte. Todavia, sem cada um deles morreríamos.
Tal como nossos corpos, a “humanidade” não é um nome genérico de “muitas pessoas,” é uma entidade da qual somos todos partes. Quando nos vemos como seres separados, temos de lutar pela sobrevivência. Mas se nos elevássemos acima de nossos seres mesquinhos apenas um momento, descobriríamos uma realidade muito diferente, onde estamos conectados e somos mutuamente solidários.
No seu ensaio, “A Liberdade,” Baal HaSulam escreve que “quando a humanidade alcançar sua meta de completo amor pelos outros, todos os corpos no mundo se unirão num único corpo e num único coração. Porém, contra isso, devemos ser vigilantes e não aproximar tanto as visões das pessoas que o desacordo e criticismo sejam terminados, pois o amor naturalmente trás com ele a proximidade de visões. E caso o criticismo e desacordo desapareçam, todo o progresso em conceitos e ideias vão cessar e a fonte do conhecimento no mundo vai secar.”
“Isto,” continua Baal HaSulam, “é a prova da obrigação de ter cuidado com a liberdade do indivíduo a respeito de conceitos e ideias, pois o inteiro desenvolvimento da sabedoria e do conhecimento são baseados na liberdade do indivíduo. Portanto, somos alertados para preservá-la com muito cuidado.” Paz, portanto, é possível somente quando somos diferentes, todavia mutuamente solidários, quando nos unimos acima de nossas diferenças. Se não transmitirmos este princípio às nações, elas não o encontrarão sozinhas e nos culparão pelas suas guerras.
O filósofo e historiador Nicholai Berdysev, escreveu em O Sentido da História: “A sobrevivência dos Judeus, sua resistência à destruição, sua persistência sob condições absolutamente peculiares e o papel fatídico desempenhado por eles na história, todos estes apontam para as fundações especificas e misteriosas do seu destino.” Mas o que Berdysev não consegue saber é a natureza especifica do nosso destino, o sentido de sermos “uma luz para as nações.” Se queremos evitar outro genocídio, devemos começar a fazer aquilo que é suposto fazermos.
Perdi quase minha inteira família no holocausto. Mas entendo que meramente os recordar não nos exclui da acção. Lembrar não os trará de volta ou impedirá uma repetição do horror. Somente nossa união acima de nossas diferenças, precisamente como é acima descrito, vai estabelecer a paz entre nós e fará de nós um modelo exemplar para o resto do mundo, “uma luz para as nações.” Se há alguma coisa que consegue preencher algum sentido no assassinato de nossos familiares, é que criaremos tamanha união que impeça que tal destino ocorra novamente.
Publicado originalmente no The Jerusalem Post